Esta foi uma análise que foi passada pelo professor de Literatura Portuguesa. Acho que ficou legalzinha:
Farsa
de Inês Pereira foi feita para ser apresentada a D. João III, em 1523. Para
Teyssier, o teatro vicentino é um teatro de corte, que subordina-se ao
cerimonial e às exigências da vida cortesã. Muitas peças foram encomendadas
para a celebração de datas importantes, como aniversários, casamentos e festas
religiosas. Embora seja uma peça teatral, há a presença de rimas em todo o
texto. Gil Vicente utiliza a medida velha, característica da poesia medieval.
As falas são compostas em redondilha maior, com sete sílabas poéticas e rimas.
Inês Pereira é uma jovem que sabe ler e escrever, o que era raro na época e que
se recusa a ter uma vida de submissão, reclusão e trabalhos domésticos, que era
o destino das mulheres. Quer casar com um homem galante, bom e discreto para
mudar a sua situação de vida. Lianor Vaz lhe propõe que se case com Pero
Marques, um camponês rico. Pero vai à casa de Inês
falar-lhe em casamento, mas ela não gosta de seus modos rústicos e das peras
que ele leva de presente para ela. Ele fica constrangido em ficar sozinho com
Inês: “Vossa mãe foi-se? Ora bem!/ Sós
nos deixou ela assi?/ Cant’eu quero me ir daqui./ não diga algum demo
alguém...”. Inês o diz para ele não aparecer mais: “Homem, não aporfieis/que não quero nem me praz;/ ide casar a Cascais!”.
Ele vai embora, mas não perde as esperanças: “Ficai-vos ora com Deus:/ serrai a porta sobre vós/ com vossa candeiazinha;/
e siquais sereis vós minha,/ entonces veremos nós”. Para Spina, a Farsa de
Inês Pereira é pouco mais que um esboço de uma comédia de costumes. Para Audrey
Bell, esta peça prova que a questão dos direitos da mulher já aparecia no
século XVI, mas para Teyssier fazer de Gil Vicente um precursor do feminismo é
ser anacrônico, pois para o dramaturgo ninguém deveria sair de sua condição.
Cada pessoa deveria procurar a sua salvação no lugar que foi determinado por
Deus no mundo e na sociedade. Esta obra é uma variação sobre o tema da
infidelidade feminina, muito constante na Idade Média. Inês representa o desejo
de ascensão social da pequena burguesia, que assim como a personagem, vê no
casamento uma forma de consegui-la. Há um desprezo pela vida camponesa e um
prestígio das maneiras cortesãs. O desenvolvimento do capitalismo provoca a
decadência da nobreza feudal e reforça o poder do monarca. A riqueza do
comércio ultramarino passa a ser a base do prestígio social. A aristocracia
passa a valorizar os ideais cavaleirescos. A nobreza, embora cada vez mais
decadente, tentava impor esses ideais a quem queria pertencer a uma classe
superior. A burguesia passa a buscar esses ideais a fim de ascensão social. Há
a predominância do discurso direto. O diálogo é o meio utilizado para criar a
narrativa da trama. Gil Vicente inspira-se nas fontes populares portuguesas em
algumas de suas peças. Na Farsa de Inês Pereira, essa inspiração está presente
no ditado popular no qual a peça está baseada: “Mais quero asno que me leve que
cavalo que me derrube”. A obra é bilíngue – português e espanhol, uma
característica presente em algumas obras de Gil Vicente e que retrata a
realidade sócio-cultural portuguesa no início do século XVI, pois as duas cortes,
e por conseguinte, as duas línguas, eram bastante próximas. Ao contrário do que
ocorre em outras peças do autor, como O Auto da Barca do Inferno e o Velho da
Horta, a protagonista trai o marido e não recebe castigos por isso.
0 comentários:
Postar um comentário